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Esqueceu a Senha?

Capítulos (1 de 50) 16 Jan, 2021

Capítulo 12 - Via de mão dupla

 Pedro estava exausto. Emocional e psicologicamente drenado. Não foi assim que ele havia imaginado seu 2011. Apesar de que, se oito anos atrás alguém houvesse perguntado onde ele se imaginava aos 20 anos, a resposta dele seria ‘estudando na Setemptrionalem’, isso não mudou. Mas ele nunca se imaginou comparecendo em bailes, vestido em tecidos que poderiam sustentar uma família na antiga Itapuã, acompanhando um homem que tinha idade para ser seu avô. Os últimos anos pareciam esvanecer num carrossel sem fim, girando e girando a procura de um sonho sem alcançá-lo nunca.

 A última memória do menino Pedro em Itapuã era seu pai arando uma plantação, então vinha poeira, tiros e gritos, e um homem fardado que o encarava antes de tudo se apagar. Antes de chegar a Ribeirão das Dores, Pedro viu, ou ouviu, um homem dar instruções para deixa-lo aos cuidados de um tal contato.

 João Pelegrini era feio, não feio como um sapo, feio como um porco, grande, gordo e sempre vermelho de embriaguez. Ou foi assim que ele ficou gravado em Pedro. A comunidade de Ribeirão das Dores era algo parecido com Itapuã, antiga e esquecida no tempo. O povo não era tão diferente do povo de Pedro, a pele escura e olhos brilhantes. Pedro era um tom bronzeado, os cabelos escuros lisos, e os olhos esmeralda. Os outros tinham cabelos revoltos, variando de encaracolados à crespos, e olhos dourados. Mas João Pelegrini era branco, róseo como um leitão.

 Davi era bobo, de um jeito inocente e hilariante, sempre agitado e curioso, e foi seu primeiro amigo, seu melhor e único amigo. Pedro cultivou a amizade dos dois com carinho e cuidado, apenas para tê-lo arrancado pela raiz. Seu pai adotivo desgostava de Davi, Pedro não entendia o porquê, Davi era gentil e compreensivo, o que mais ele podia querer em um amigo? Para João Pelegrini, o menino era muito ‘sensível’.

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 Ainda assim, Pedro se recusava a se afastar de Davi. E para cada vez que os meninos corriam para se esconder morro acima, eram dez estalar do cinto do senhor Pelegrini nas costas de Pedro. Até o fatídico dia, pouco antes de seu aniversário de quinze anos, que alguém fez soltou um boato direto na mão do homem mais velho, e foi o estopim, Pedro teria que decidir entre ir ‘prestar curso para doutor’ ou ficar e ter Davi receber o mesmo tratamento que Pedro recebeu por vários anos. Pedro não se despediu de Davi.

 E se pelos dois anos seguintes Pedro achou que sua vida era apenas amargura, por não ter explicado à Davi o motivo de sua partida, ele não estava preparado para o inferno que foi quando ele viu nos jornais que Ribeirão das Dores havia sido extinguida por um incêndio, o homem fardado na televisão tão semelhante ao homem de sua última lembrança de Itapuã.

 O problema imediato é que, sem o dinheiro do pai adotivo, ele estava por si e teria que dar um jeito de procurar um emprego, mas tudo o que Pedro conseguia pensar era que Davi havia morrido, e agora ele nunca poderia pedir desculpas, ou mesmo perdão por tê-lo abandonado, e por nunca tê-lo respondido que o amava.

 Sem caminhos, sonhos, nem meio de vida, Pedro deixou-se afundar. E afundando ele acabou num local em Carapiúna onde rapazes e moças podiam vender ‘serviços’ com discrição. Como Pedro chegou ali, ele não sabia explicar, e o que aconteceu depois era algo ainda mais inacreditável, um senhor, de não menos de sessenta anos, ofereceu ao rapaz uma proposta ‘irrecusável’.

 E foi assim que Pedro, um dia Malaquias, uma vez Pelegrini, era agora Pedro Martins. Fausto Martins era um expedicionário, um influencer, e um professor. E ele ofereceu a Pedro mais do que o garoto jamais havia sonhado para si, um lugar mais luxuoso que o casarão dos Pelegrini, roupas mais caras que todos os trajes sociais que Pedro já havia vestido, e presença na alta sociedade. Passaram-se quase dois anos sem que Fausto cobrasse algum ‘serviço’ pelo investimento que ele havia feito no rapaz, e Pedro temia pelo dia que ele cobraria.

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