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Esqueceu a Senha?

Capítulos (3 de 23) 02 May, 2020

Red: 005

Acho que contei tudo.

Não me aprofundei em detalhes, mas penso ter esclarecido os eventos esquisitos que nos levaram a ficar de frente com o mais lendário dos youkais. Os eventos que consagraram Yuna como Cavaleira de Cristal, ou pelo menos a deixaram perto de sua consagração. Esse que não era um título, simplesmente uma alcunha que a transformou em uma lenda em escala global, foi oficializado, se é que posso usar esse termo, após o que aconteceu naquela madrugada no Circuito de Tsukuba.

A história de como ela recebeu um apelido desses não é o verdadeiro foco, mas também não é como se pudesse ser deixada de lado.

Encarem como uma bonificação.

Como a história por trás da história.

Ou como uma DLC.

— Isso é tipo uma DLC?

Dessa vez, não foi uma quebra da quarta parede. A guria estava falando sério.

Depois dela atravessar o crânio do youkai dragão com o 23° Tóquio em sua forma de lança, nós assumimos que a batalha estava vencida. E, de certa forma, estava. Contudo, a guria acabou fazendo um cálculo errôneo anteriormente, e fez uma afirmação que não deveria ter sido feita.

Uma frase no início do capítulo um.

“Alguma ideia, seu pamonha?” “Eu? Achei que você fosse a gênia da guerra, guria.” “Mas isto não é uma guerra, é?”

Olhando daquela nova perspectiva, aquele circuito oval estava se tornando um campo de guerra. E nossa batalha, por consequência, uma guerra também.

Vencemos a batalha, mas não a guerra.

Yuna já havia colocado seu uniforme de volta sobre seu corpo, e assim que ela montou em minhas costas, nós começamos a sair de fininho daquele autódromo da super velocidade. Mas, poucos momentos depois, quando minhas quatros patas estavam para sair em uma das extremidades da pista, um rugido colérico aconteceu, ecoando abafado às nossas costas.

Meu corpo canino se virou para que meus olhos procurassem a origem daquele grito, e consequentemente o da guria me imitou.

E daí veio a questão:

— Isso é tipo uma DLC?

O que estava sendo registrado em nossos campos de visão, era a imagem bizarra de um monte de carne de dragão sendo moída e engolida pelo seu próprio estomago, em uma velocidade assustadora, considerando a quantidade de massa que ele tinha.

— DLC são aqueles adicionais em jogos eletrônicos, não são?

— Sim, sim. Mas, agora observando com mais atenção, acho que ele estava com algum tipo de verme.

— Talvez ele só estivesse com fome?

— Como assim?

— Mena disse uma vez que o estomago começa a se alimentar do próprio corpo se você passar um certo tempo sem comer.

— Hmm, entendi. Pode ser isso, verdade. Só que não faz muito sentido porque ele era bem gordo.

— Discordo, guria. Acho que por ser gordo, que o estomago está o degustando tão rápido.

— Bem observado, Império das Pulgas, vai ganhar um biscoito.

Dessa vez, eu ignorei.

— Veja, tem algo ao centro, — indiquei.

— Hã, que nojinho.

Em meio a toda aquela carne sendo sorvida como um maremoto, uma silhueta vermelha se revelou, como se o estomago daquele dragão tivesse uma forma humanoide. A figura parecia estar sendo formada pela carne que era absorvida, mas com uma melhor olhada, era possível notar que aquela silhueta quem estava se alimentando daquele mar vermelho. A boca estava aberta para o alto e a carne moída escorria por todo seu corpo, o encobrindo por completo, até adentrar por sua cavidade oral.

— Seu pamonha, está com o celular aí?

— Sou um lobo, guria, não uso essas coisas.

— Tsc, iria dar um ótimo mistério na Deep Web.

O montante de carne estava para ser sorvido por completo, e assim, a figura devoradora ao centro daquele caos canibal, nos seria apresentada da melhor maneira. A verdadeira forma de uma lendária criatura, estava para nos ser revelada.

A última massa de carne moída subiu pelo corpo do youkai, o descobrindo dos pés à cabeça. Primeiro, as pernas totalmente vermelhas, cujas canelas eram protegidas por escamas cinzas. Quando o quadril foi exposto, descobrimos que se tratava de uma mulher, e havia somente um tapa-sexo cinza e escamoso a cobrindo ali. O tronco também estava nu, e assim como suas pernas, era de um vermelho escuro, com exceção de seus seios, também censurados com escamas cinzas. E, ao terminar de sorver a carne, sua face se mostrou ao mundo. Um belo rosto carmesim, com cabelos curtos e brancos com as pontas cortadas quadradas. De olhos fechados e apontados para o céu, não era possível ver a cor deles, mas não demorou nada para que ela baixasse o rosto e revelasse seus olhos verdes como a água de um lago.

— Muito gostosa.

— Guria?! — Aquele era realmente o primeiro comentário a ser feito?

— Quando eu crescer quero ser igual a ela.

— Vermelha e com escamas?!

— E a postura dela a deixa mais sensual.

— Por acaso está pensando alto?!

Sem trazer respostas para minhas perguntas, mais uma vez, Yuna desceu de minhas costas. Ela apontou os olhos azul-escuros diretamente contra os olhos verde-claros da youkai.

Yamata no Orochi. Eu podia jurar que o mais lendário youkai era um dragão com várias cabeças e várias caudas. Mas, o que estava diante de nós, era uma mulher. Em outras palavras, para uma melhor definição, aparentava ser uma híbrida de dragão e mulher. Ou uma espécie de fusão, quem sabe. Ou, indo mais além, talvez fosse como as transformações do Frieza.

Reza a lenda que os Três Tesouros do Japão surgiram do corpo desse youkai em sua batalha contra o deus Susanoo. Se for verdade, a quantidade de magia que esse dragão um dia teve é realmente incomensurável, talvez até superando o poder de uma divindade. Contudo, atualmente, as relíquias estão fora de seu corpo e ele já havia sido derrotado. O mais provável, é que seus poderes foram reduzidos durante todos esses anos, até o ponto do dragão se tornar uma grande bola de escamas, que tem como transformação se tornar uma bela mulher com pele vermelha.

Ela tinha uma cauda, inclusive. Se projetava longa da base de sua coluna e sua extremidade era coberta com escamas cinzas, como uma tampa de caneta.

Acredite se quiser.

— Não acredito que sexualizaram até um lendário dragão, seu pamonha.

— Esta é sua preocupação no momento?!

— E deveria estar me preocupando com algo além disso?

— Uma mulher dragão catalogada como youkai, talvez!

A guria iniciou seus passos à frente, saindo do asfalto liso que formava aquele circuito oval, e adentrando no terreno que ficava ao centro da pista. Então, ela parou, demarcando uma distância entre elas que a Assassina de Youkais julgou ser segura.

— Eu não esperava que você pudesse se transformar, seu pamonha, mas aqui estamos nós, não é?

Em resposta, de um jeito erótico, Yamata no Orochi passou a língua nos lábios.

— É... eu não sei exatamente o que isso significa — comentou Yuna —, mas já vi que você é chegada na linguagem de sinais.

A cauda da youkai abanou o vácuo duas vezes, o que julgamos também ser algum tipo de resposta.

No final, acho que não tinha significado nenhum.

— Que seja, — disse a guria. — Como você é imune ao gelo, parece que vamos resolver nossas diferenças em um combate corpo a corpo, só que até a morte. As regras são que não há regras, então pode usufruir de seus poderes, assim como eu farei, ou não.

As condições foram aceitas com o silêncio da youkai.

A isso, a guria começou a tirar sua roupa. Ela retirou sua longa regata mística de basquete e a jogou para o alto. Em pleno ar, o tecido se retorceu e esticou de tal maneira, que o uniforme acabou se transformando em uma lança carmesim. A arma caiu na horizontal, certeiramente sobre a mão da Assassina de Youkais, que agora estava exibindo seu corpo angelical, vestindo somente sua lingerie vermelha que combinava com seu uniforme místico.

Yuna tomou a posição de uma verdadeira lanceira, apontando sua arma cor de sangue para Yamata no Orochi.

Era uma imagem que se deveria ver ao fazer uma turnê pelo mural de feitos da Assassina de Youkais.

— E aí, o que é que vai ser?

Esta era a pergunta que geralmente a guria usava como ultimato. Era como um último aviso antes de seu alvo entrar em uma caverna oculta entre a vida e a morte. Era a placa de advertência final antes do precipício ao fim da estrada.

Nenhuma resposta foi obtida além de um sorriso discreto.

E como da vez anterior em que Yuna arrancou em ataque, um rastro de poeira foi jogado para trás. A Assassina de Youkais, com sua destreza sobrenatural, surgiu de súbito às costas da youkai, com o braço e lança prontos para desferir um único golpe letal. Porém, surpreendentemente mais rápido que os disparos neurais da guria, a cauda da mulher dragão se moveu com incrível precisão para se envolver no pescoço de minha kouhai.

Ela foi erguida pelo membro reptiliano que a enforcava.

A lança foi solta, caindo inofensiva ao chão.

Yamata no Orochi a olhou por cima do ombro, enquanto ela tentava se livrar com as mãos do aperto daquela cauda de dragão.

Diante daquela cena, e como um dos participantes ativos daquela missão, eu decidi que estava na hora de tomar alguma atitude em relação àquilo. Latido isso, minhas quatro patas começaram a funcionar e eu avancei na direção da youkai.

A princípio, disparei em uma velocidade comum para um lobo do meu porte. Ao meio do caminho, enquanto a mulher dragão continuava observando sua tortura para com Yuna Nate, eu recalculei minha rota, descrevendo um arco na terra para atacá-la pelas costas, onde sua cauda, que funcionava também para combate, estava ocupada abusando de uma menor de idade.

Minha ideia era simples. Eu iria usar minha velocidade acima do som para realizar um ataque direto, sem brechas para uma possível defesa, onde o objetivo era cravar meus dentes na cauda da youkai, libertando a guria e também danificando o que parecia ser uma peça importante de seu corpo.

Entretanto...

No momento em que subjuguei a velocidade do som, o mundo à minha volta entrou em um efeito de câmera lenta. Tudo ao redor estava praticamente congelado no espaço e tempo, exceto minha existência mental e física. Com essa vantagem, minhas patas me moveram por trás de Yamata no Orochi, e eu já estava bem próximo quando ela... moveu a cabeça?

Ela moveu a cabeça em uma velocidade normal?

Em não câmera lenta?

A mulher dragão observava a guria por cima de seu ombro esquerdo e eu estava atacando pelo seu flanco direito. Em teoria, na velocidade e posição em que eu estava, ela não conseguiria pressentir minha movimentação a tempo, apenas por intuição. A youkai sabia que eu estava me aproximando e, naquelas circunstâncias, só poderia ter notado pelo som. Mas eu estava acima do som, naquele momento. Portanto, a única conclusão é a que me parece mais óbvia.

Yamata no Orochi também se movia acima do som.

Ela levou seu rosto vermelho da esquerda para direita, cravando seus olhos em mim por sobre seu ombro. Seu olhar era como o de alguém que observa um inseto irritante em aproximação.

Da minha parte, não havia mais a opção de recuar. Mesmo com os olhos verde-claros mirando em mim como um franco-atirador, eu já estava em ataque e era tudo ou nada ali. Minha mandíbula se abriu e minhas presas foram expostas para abocanhar a cauda da youkai. No entanto, ela reagiu.

Não era como se eu não esperasse uma reação, mas a agilidade de Yamata no Orochi foi o que me surpreendeu. Parecia que ela estava em uma existência de velocidade maior do que a minha, que já estava acima do som. E, quando eu estava para mordê-la, a youkai virou o corpo, afastando sua cauda de meus dentes e, quase ao mesmo tempo, movimentando-a para lançar Yuna longe. No instante seguinte, a mão de Yamata agarrou meu pescoço pela lateral e ela me empurrou para o chão, me pressionando contra o solo.

O espaço e tempo voltou ao normal para mim.

Escutei o gemido da guria capotando na terra, mas não consegui ver sua localização.

A força daquela mulher ultrapassava meu conceito de absurdo. Só com uma mão, ela conseguia me manter pressionado no chão, deixando livre minhas patas para que pudessem se debater com a dor de ser sufocado; algo que era extremamente humilhante para um líder de alcateia como eu.

Já era certo meu total desgosto por aquela youkai.

Estava no ponto de eu tomar o cargo da guria e me tornar um genocida.

— Tire as mãos do meu neném! — E falando no diabo, parecia que a Assassina de Youkais já estava de pé. Ela rosnou aquelas palavras contra Yamata no Orochi e deixou a situação ainda mais constrangedora para mim.

Não foi como se a youkai obedecesse a guria, mas ela afastou sua mão de meu pescoço e se virou para Yuna, ignorando completamente minha existência canina, logo que a frase da guria passou por seus ouvidos.

Meu cérebro pedia por oxigênio e eu arfava enquanto o coletava. Ao mesmo tempo, comecei a me erguer, cambaleando para o lado, na intenção de me afastar daquela youkai e da área onde o segundo round iria começar.

— É... eu não esperava que o soltasse tão facilmente — disse a guria. — Não sei o que fazer, sinto que algo está fora do script.

Aos comentários de Yuna, a mulher dragão somente grunhiu. Ela baixou o olhar e viu 23° Tóquio, o uniforme em forma de lança, estendido aos seus pés. Sem esforços desnecessários, a cauda da youkai se moveu e apanhou a arma ao solo, erguendo-a até a altura de seu peito. Ela estava para usar a lança de sua adversária contra ela.

A guria, por sua vez, tendo que enfrentar um lendário youkai armado com o místico 23° Tóquio, não teve outra escolha além de pegar pesado. Ela balançou os antebraços com um movimento de alavanca, fazendo com que duas lanças curtas de gelo surgissem em suas mãos. Não suficientemente preparada, do corpo da guria, quatro clones também armados com lanças gêmeas, apareceram em um passe de mágica, dois para cada lado.

— Estamos prontas, mestra!

Os clones eram idênticos a sua original, devidamente como o conceito de clone pede, mas a devoção deles estava um nível acima até de um shikigami. Ao anunciarem que estavam preparados, eles tomaram uma postura de combate com as lanças, que lembravam a imagem de uma águia.

— Vamos fazer o Pearl Harbor.

— Hã?! Mas mestra...

— Não temos outra escolha. Vamos seguir a tática padrão até encontrarmos uma brecha na guarda dela.

— Ela é vermelha.

— E aquela cauda, mestra, se move?

— Se aquela cauda nos atacar, vou pedir meus direitos como clone...

— Ninguém vai pedir nada, está bem? — A guria original também tomou a posição de combate. — Me protejam com a vida de vocês, eu cuido do resto.

— Positivo, mestra!

Com um sorriso sádico, Yamata no Orochi se preparou para a ofensiva que vinha em sua direção. Um quinteto de gurias avançou veloz e furioso, alternando suas posições e embaralhando os clones da original. A gangue de Yuna iniciou sua avalanche de golpes rápidos e curtos, forçando a youkai a dar pequenos passos para conseguir se defender. E, embora as gurias fossem muito ágeis e precisas em seus movimentos, a mulher dragão conseguia se defender de todos, sem dificuldades. Ela estava cercada, recebendo ataques de cinco pontos diferentes, mas como conseguia deixar sua existência acima da velocidade do som, é provável que todos aqueles ataques estivessem em câmera lenta para ela.

— Está acuado, cão?

Mais uma vez, sem deixar rastros de sua presença, Detetive Doz se apresenta no Circuito de Tsukuba. Era incrível como ele conseguia chegar tão misteriosamente nos lugares, principalmente por conta das grandes distâncias. E mesmo para o meu olfato sobrenatural, o cheiro daquele homem era sempre um enigma para minhas narinas caninas.

— Não estou com medo, se foi o que quis dizer — respondi.

— Sei, sei. — Suas mãos estavam nos bolsos da blusa, mas a direita logo se revelou com uma barra de chocolate entre os dedos. Ele deu uma mordida no doce vindo do cacau e leite, e engoliu sem ao menos mastigar. — Acho que não entendeu minha pergunta, mas o que quero saber é se está com medo pela Cavaleira de Cristal.

— Diz, pela guria?

— Isso.

— E como queria que eu interpretasse assim só me perguntando se estou acuado?!

— Hmm... verdade. Acho que usei mal as palavras.

— Você só deixou de usá-las!

— Certo, certo, não mude de assunto, cão. Olhe bem para o combate à sua frente.

— Estou observando.

— Então já percebeu, não é?

— O que exatamente devo perceber?

— Minha Cavaleira, ora. É certo que ela não pode vencer esse lendário youkai, que no passado só pôde ser derrotado por um deus. Mesmo Yamata no Orochi estando com seu poder reduzido em cinco vezes, minha Cavaleira não pode vencer nem com sua melhor estratégia.

— Hmph, você desconhece a capacidade de Yuna.

— Posso não conhecer os limites de minha Cavaleira, cão, mas vou lhe passar uma importante lição sobre guerra.

— Que seria?

— Certas batalhas devem ser sentidas e não pensadas; alguns adversários devem ser devastados somente com a mais pura força bruta.

E era com essa lição que a youkai batalhava. Com sua cauda, de súbito, ela golpeou o clone da guria que a atacava por trás, arrancando sua cabeça e o desfazendo em neve. Assim, só restaram quatro. Três sósias e a original. O que não durou muito tempo. Após a morte do primeiro clone, os outros se reposicionaram para continuar com os ataques massivos e incansáveis. Porém, a mulher dragão se antecipou a isso, e com a lança que pegou de Yuna, ela atravessou a base do pescoço do clone à sua esquerda, também o esfarelando em neve.

Àquela situação, a original e suas réplicas deram um passo para trás, em uma formação triangular.

Como se para confirmar o ensinamento do detetive, qualquer que fosse a tática da guria, não estava dando certo.

A selvageria e força bruta de Yamata no Orochi, era o que estava decidindo aquele confronto.

— Tenho que ajudá-la...

— Não faça isso, cão.

— Por quê? Ela precisa...

— É claro que ela precisa de ajuda. Mas não é da sua ajuda que ela precisa. — Na mão esquerda do detetive, que em algum momento saíra do bolso da blusa, estava envolvida entre seus dedos a haste dourada de uma lança encantadora.

— Está falando disso?

O som do ar sendo rasgado anunciou a retomada ofensiva da Assassina de Youkais. Os dois clones e a original avançaram, sem gentileza. Continuaram com os golpes rápidos e com a aproximação curta contra a mulher dragão, que continuou se defendendo com o 23° Tóquio, e se esquivando com pequenos passos ágeis.

Segundos depois dessa nova avalanche de ataques, um terceiro clone foi golpeado pela lança carmesim, e se desfez. Só restaram uma sósia e a original. Era claro que a estratégia da guria não iria dar em nada. Algo que foi confirmado um momento depois, quando o último clone foi divido em dois na diagonal, com um movimento seco da lança carmesim.

A próxima era a verdadeira Yuna Nate.

Agora quem dominava o embate era Yamata no Orochi.

A youkai girou após dar fim ao último clone, e acorrentou seu movimento golpeando em arco com a lança. Ao que a guria desviou, inclinando o tronco para trás. Então, a mulher dragão deu mais um giro, agora empurrando a lança em um golpe reto. Mas, novamente a guria se safou, dando um passo para o lado e prendendo a lança carmesim entre suas lanças gêmeas no estado sólido da água.

Eu acho que a intenção da guria era desarmar a youkai, e de certa forma ela conseguiu isso, só que não do jeito que ela imaginou. Muito menos de um jeito vantajoso para ela em batalha.

Yamata no Orochi soltou a lança, assim que Yuna a prendeu entre as dela. Ao mesmo tempo que o 23° Tóquio foi liberto, a youkai se moveu com incrível destreza, dando um passo longo e pegando a guria com a guarda baixa.

A Assassina de Youkais foi alvejada no meio do tórax, com um golpe da palma da mão de Yamata no Orochi.

Seu corpo foi lançado para trás, caindo de costas no solo e deslizando na terra. E, dessa vez, ela permaneceu ao chão.

— Guria!

— Ei, não...!

Ignorando a advertência do detetive, meus instintos de lobo não conseguiam deixar de lado meus sentimentos e preocupação com aquela garota. Minhas patas me moveram em alta velocidade na direção de Yuna, passando pela lateral da mulher dragão que mal reparou em minha existência.

— Guria! — Mexi com meu focinho na barriga dela, como se para acordá-la. Ela não estava morta, mas o cheiro de sangue era bastante forte na região de seu peito. Era uma hemorragia interna que já estava sendo tratada pela capacidade regenerativa da guria.

Seus olhos começaram a abrir.

— Hmm, te preocupei de novo, não é?

— Idiota! Você não pode com esse monstro. Chame aquela lança.

— Seu pamonha, o que está dizendo?

— Gungnir, guria! É o único...

Interrompendo-me, um brilho laranja chamou minha atenção para a youkai. Um raio de fogo foi disparado em nossa direção. Instintivamente eu me coloquei à frente de Yuna e lancei contra a rajada de chamas um super latido. A onda sonora colidiu contra o fogo e serviu como escudo para nós. O raio de fogo acabou cessando.

— Guria, o detetive disse que algumas batalhas devem ser vencidas pela força bruta. A lança é a ajuda que você precisa. Aquele detetive deve ter deduzido esta situação, por isso lhe ofereceu a arma anteriormente. A lança também podia retirar o guri do controle mental, e ele já tinha isso em mente. Seja lá o que esse detetive for, a ajuda que ele está te oferecendo não é a lança Gungnir, e sim, a antecipação.

Embora aquele misterioso homem que se apresentou como Detetive Doz tenha dito que algumas batalhas devem ser vencidas somente pela força bruta, usar esse método não seria também uma decisão estratégica? Não é o pensamento que vem antes da ação?

— Entendi, Império das Pulgas. — A mão da guria acariciou minhas costas até a minha cabeça, e então notei que ela já estava de pé. — Você caiu na falácia de um detetive pedófilo e isso é triste.

— Não é o momento para piadas!

Ela tomou a minha frente.

— Você foi um bom menino, Ulim, mas agora preciso que se afaste. — Ela estendeu o braço direito para frente. — Está na hora de deixar meu orgulho de lado.

E eu sabia o que estava por vir. Já era certo o que ela estava para fazer.

— Venha, Gungnir!

Foi com um clarão dourado que a lança voou das mãos do detetive e cruzou o ar como uma flecha para a mão de Yuna. Ao mesmo tempo em que ela apanhou sua nova arma, Yamata no Orochi abriu a boca, preparando uma nova rajada de chamas.

— Guria...?

— Se a lenda for real, quando lançada, Gungnir nunca erra seu alvo.

Ela disse mais para si mesma do que para mim, que já havia tomado uma certa distância. Depois disso, tomou a posição de uma arremessadora olímpica de dardo. O brilho nos olhos da guria parecia ser de outra pessoa. Ou melhor, era o mesmo brilho que lembrava o mundo quem era a Assassina de Youkais, mas exercendo uma pressão como se aqueles olhos fossem de uma deusa guerreira.

Os olhos da Cavaleira de Cristal.

— Então, é assim que ele a vê...

A youkai disparou seu raio de fogo, que veio mais devastador que o anterior contra Yuna. E ela, por sua vez, encarou com sua invejável coragem aquela rajada de chamas laranjas, que se assemelhavam a um sopro infernal. A guria enfim lançou Gungnir, que disparou na forma de um relâmpago dourado, não só atravessando a onda de fogo à sua frente, como a cessando em labaredas em um passe de mágica.

A lenda era real.

Nada poderia impedir Gungnir de alcançar seu alvo.

A lança dourada se cravou na cabeça de Yamata no Orochi.

Mais uma vez, na história do Japão, o lendário youkai foi por terra. Antes pelo deus Susanoo, agora por Yuna Nate.

— Tsc!

— O que foi, guria?

— Isso foi ridículo. — Ela ainda estava na pose em que arremessou Gungnir, mas ajeitou sua postura, levando as mãos ao quadril. — Não gostei desse desfecho, foi igual quando a Armadura de Sagitário aparece e o Seiya resolve tudo com o disparo de uma flecha.

Hmm, vendo dessa forma...

— O que é muito engraçado — continuou ela —, porque até onde sei, os Cavaleiros não podem usar armas, não é?

— Você está perguntando para um lobo que só assistiu o Lost Canvas.

— Nossa, Ulim, você me decepciona às vezes.

— Ué, por quê?

— Quem assiste só o spin-off e ignora a série original? Você está desonrando o autor dessa maneira, sabia? Assim que voltarmos, vamos aproveitar meu castigo e assistir ao original. Verá que não há nada mais legal do que o Cólera do Dragão.

— ... — bem, não estou aqui para contrariar Yuna Nate.

— Viu só, minha Cavaleira, deveria ter me escutado...

— Ei! — A guria deu um passo para trás, abraçando os seios, ao detetive que apareceu de fininho perto de nós. — Seu pedófilo, você iria me agarrar de repente!

— Quê?! Não, claro não!

— Ia sim! Você é um apertador de seios, como já foi comprovado por sua carteira.

— Já disse que foi só uma missão!

— Ulim, rápido, vá pegar meu uniforme! Não vou continuar dando o prazer para esse chocólatra esquisito de olhar o corpo mais bonito deste país.

— Guria, quanto a isso...

Ela voltou a atenção para mim e eu apontei com meu focinho para o 23° Tóquio.

— Aaaah! — E Yuna se espantou. — Como assim?!

— Pois é, ele já tinha sido chamuscado quando o youkai era um dragão gordo. Acho que as chamas o danificaram bastante da primeira vez. Afinal, é o 23° Quioto que é à prova de chamas.

— Mentira, — choramingou a guria, caindo de joelhos.

Talvez a visão de seu uniforme praticamente em cinzas, fosse chocante demais para a Assassina de Youkais que estava exausta. Mas, a verdade é que esse prejuízo não só iria prolongar ainda mais seu castigo, como seria descontado de seu pagamento o valor parcial do uniforme.

E quanto vocês acham que custa um uniforme místico, feito de um tecido mitológico, e ainda por cima personalizado em uma regata de basquete?

Considere agora que o iene nem é a moeda mais valiosa do mundo.

— Estou falida.

— Guria, já aproveitando, como vai me comprar carne, nesta situação?

— Hã, Ulim, não faça isso...

— Fazia parte do nosso acordo, e sei que você é uma guria de palavra.

— Caraca... vou ter que vender meu corpo.

— Ei, não precisa chegar a esse ponto!

— Detetive, são dois mil ienes por hora.

— Tô fora. — Ele virou as costas para nós.

— Quê?! Mas é sua oportunidade de ouro!

— Já disse que não sou pedófilo, e minha missão está completa. Ou melhor, o caso está encerrado.

— Só veio aqui me ver seminua, é?

— Não, claro que não. — Ele a olhou por cima do ombro, então estendeu o braço na direção de Gungnir, cravada na testa de Yamata no Orochi. A lança voou para a mão do detetive, do mesmo jeito que voou para a da guria. — Suponho que não vai ficar com ela, não é?

— O quê? Isso aí? — A guria desviou o olhar, cruzando os braços e estufando as bochechas. — Já teve sua utilidade, pode jogar fora.

— Como imaginei. Ficará comigo, mocinha, mas sabe que se precisar é só chamá-la.

— Hmph, pode levar, pedófilo, e aproveite enquanto está com o meu cheiro para... ei, cadê ele?

E o detetive, tão de repente quanto ele surgia, saiu de fininho.

— Guria.

Yuna virou o rosto para mim. Seu olhar cheio de dúvidas tinha o brilho inocente e seu rosto jovial, sua beleza chegava a ser terapêutica até mesmo para um líder de alcateia como eu.

Ela não questionou meu chamado com palavras, e sim com seus olhos azul-escuros.

— Já chega, guria, vamos voltar para a casa. Você ainda precisa dormir. 

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