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Esqueceu a Senha?

Capítulos (2 de 4) 01 Oct, 2019

Capítulo I - Estouros

Muitas histórias começam com atos incríveis, ações extasiantes, batalhas mirabolantes…

Sentia meu corpo tão leve quanto o ar, tão duro como a mais pesada e densa montanha, mas algo assim não seria possível. Estava deitado no ar, envolto por um mundo negro, sem forma, vazio. Deitei minha cabeça e olhei à frente, um pequeno ponto de luz crescia pouco à pouco, como se pulsasse e a cada pulso dobrasse de tamanho. 'Bum', 'bum'... A luz continuou crescendo. Hipnotizado por aquela loucura eu não conseguia desviar o olhar, parecia quente, parecia fria e isso não era possível. Vários tentáculos com o mesmo brilho branco vieram da esfera luminosa, passaram se entrelaçando ao meu corpo, cobrindo-no, e em seguida apertando-no. Senti meus pulmões pararem de respirar pela pressão, minhas bochechas pareciam queimar e meus dedos tremiam, então os tentáculos me apertaram mais, mais e mais até que ouvi um 'plop', um estouro, e tudo acabou em preto, até mesmo meu corpo.

Cai em cima da cama com força, ricocheteei no colchão e obediente a física meu corpo terminou no chão. Levantei lentamente com as costas doendo, reclamei baixinho, esfreguei a cabeça um pouco e observei tudo ao meu redor. Minha vista estava borrada, mas lá estava a cama, a cômoda, a porta e o quadro, a janela fechada... O preto havia sumido.

A minha história...

Então uma pontada me atingiu, não como uma dor de cabeça, mas como a dor da própria morte apertando meu crânio com suas mãos esqueléticas e sorrindo com seus dentes podres. Rangi os dentes tentando controlar a dor, meu corpo se curvou e gritos escaparam sem que pudesse detê-los, minhas têmporas pareciam arder em chamas e tudo que podia fazer era bater a cabeça tentando conter tudo isso lá dentro.

Começa assim.

Ouvi a porta se abrir com um baque tão fraco como se tivesse acertado uma almofada ao invés da parede, mas talvez eu estivesse ficando surdo lentamente, com essa dor, não me surpreenderia. Alguém entrou pouco antes que minha consciência escapasse com outro estouro: 'plop'.


***


Linda era dona de um corpo esculpido em outros tempos, numa época menos dura e mais... Viva, suas curvas escapavam para os olhos até mesmo atrás do grande e pesado avental de couro marrom. Seus braços fortes cobertos pela longa manga de sua blusa verde acertaram o martelo contra o metal em brasa, faíscas voaram para todos os lados com seu brilho amarelado sujo de laranja.

Segurando uma enorme pinça de ferro, Mario, seu filho, pegou o metal e mergulhou em um profundo balde de pedra cheio d'água, uma fumaça branca subiu e preencheu a oficina com o cheiro terrível do metal queimado.

— Não importa quantas vezes eu faça, não vou me acostumar nunca com esse cheiro! — reclamou com sua voz que desnivelava entre o grave e o agudo, como qualquer garoto adolescente.

Linda apenas riu.

Ele retirou o metal o repousando num gancho na parede, ficaria lá até realmente terminar de esfriar.

Ela então abriu a porta e saiu da oficina para o exterior, após um minuto ou dois Mario voltou a vê-la quando acabara de erguer a tenda e abrir as janelas transformando a oficina em um comércio de objetos baseados em metal.

— Mãe.

— Sim, filho? — Ela ainda ajeitava as madeiras que firmavam a tenda quando respondeu.

— É sobre ontem...

Linda engoliu em seco.

— Ah! Certo. Não se preocupe. Já sei o que fazer sobre aquilo...

Mario se surpreendeu e exibiu esse sentimento com suas sobrancelhas.

— Você sabe?

— Uhum, sua irmã passou pela mesma coisa quando era mais nova — respondeu voltando para dentro.

Ela foi direto à bancada de trabalho, pegou mais material bruto e começou à derrete-lo no forno.

— Claro, você foi uma surpresa… Não esperava que fosse capaz de absorver magia, pois até então, apenas as mulheres conseguem. Nunca ouvi falar de nenhum homem fazendo isso…

Mario andou até o balcão e ficou observando o que havia do lado de fora, uma carroça vinha pela estrada de terra, à esquerda.

— Então isso... É incomum? O que as pessoas achariam disso...? Não costumam aceitar bem as novidades por aqui...

— Eu sei que… Coisas novas não são aceitas tão fácil... — mordeu o polegar.

Linda se levantou, foi até o filho e o abraçou acolhendo-o como fazia em noites de pesadelos à meia década atrás.

— Mas como eu disse, já sei o que fazer.


***


Era um pouco depois da metade do dia, as sombras recuadas para debaixo dos corpos e objetos graças ao sol posto um pouco depois do ponto mais alto do firmamento. Mario caminhava pela estrada de terra junto de sua mãe e sua irmã, Lira. Ele estava bem arrumado, como nunca antes estivera, sua mãe também havia dado um trato e escolhido roupas mais ajeitadas do que as que usava normalmente, Lira estava vestida com o uniforme escolar de uma das escolas mais importantes de todas as terras das bruxas.

— Para onde vamos? — Mario perguntou a sua mãe.

— Resolver seu probleminha, oras — Lira respondeu no lugar dela, em um tom pouco gentil.

— A verdade é que só existe uma pessoa que pode nos ajudar quanto a isso, espero que ela compreenda bem... — Linda suspirou.

Mario estava curioso quanto a tudo, não suportava ver sua mãe e sua irmã mancomunadas à não falar muito sobre o assunto.

— E quem seria ela?


***


As paredes de madeira da diretoria eram tão escuras quanto a noite, a iluminação das lamparinas talvez não fossem suficientes caso a janela não estivesse aberta, os raios de sol entravam por ela destacando ainda mais a figura feminina que perturbava Mario.

A escola para bruxas de Dioran talvez fosse de todas as escolas, a que mais se destacava, com suas alunas engenhosas como sábios, obedientes como soldados e poderosas como os antigos monstros, isso realmente tornava o lugar o melhor para se estudar.

O ensino da magia desde que o mundo é mundo sempre fora reservado as mulheres, por isso no mundo bruxo, as mulheres são quem estão na política, na segurança e em todos os cargos de alta importância e valor, enquanto os homens se preocupam em realizar o trabalho pesado e dispendioso.

Quando criança, Mario ouvia histórias sobre o mundo humano, sobre guerras, sobre como dividiram a sociedade em duas por um muro assustadoramente grande durante o início da idade média e de como funcionava o caos humano. Homens criando geringonças, homens fazendo política, religião... Parecia impossível tais coisas à criança que nasceu cercado pela predomínio feminino.

Mario observava a mulher com leve concentração, ele suspeitava dos motivos que sua mãe o trouxera justamente a essa mulher, ainda que não a conhecesse, sabia o que podia fazer.

A diretora se pôs de pé para receber suas visitas, Linda, Lira e Mario se aproximaram da mesa dela. Ela cruzou os braços e abriu um sorriso animado observando Linda.

— Ora, ora! Quando soube que Linda Lascey estava interessada em falar comigo, mal pude acreditar!

Linda sorriu sem graça.

— É algo realmente importante... Sei que não nos falamos desde que meu marido faleceu, mas... Você é a única que pode me ajudar, Carmen.

— É bom que seja interessante — a diretora falou imediatamente após Linda fechar a boca.

Carmen se sentou em sua cadeira — quase poltrona — e começou a bater o dedo na mesa esperando pelo que Linda lhe responderia. Linda não se impressionou pelo que Carmen disse, embora Mario se sentira um pouco incomodado.

— Vamos, diga, como posso te ajudar minha querida? — Insistiu pela demora de Linda em oferece-la uma resposta.

Linda olhou para o filho.

— Carmen. Mario, meu filho, é um bruxo... — Olhou para ela — por favor, permita que ele estude aqui.

A diretora arregalou os olhos por um instante e logo os semicerrou, a curiosidade começou a tomar conta de seu peito.

— Um bruxo ahn? Isso é realmente interessante!

Ela se levantou e encarou Mario com tanto ânimo que ele deu um passo para trás com receio do que aquela mulher poderia lhe fazer.

— Me mostre do que é capaz, querido — sorriu oferecendo a própria varinha à Mario.

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